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EDUARDO KAC, UM PIONEIRO

31/01/2014

EDUARDO KAC, UM PIONEIRO

Precursor da bioarte e da arte transgênica e famoso internacionalmente pela criação da coelha verde Alba, o artista brasileiro, residente em Chicago, apresenta, dentro do Projeto Poesia Visual, uma retrospectiva de suas obras de 1982 a 1999, no Oi Futuro em Ipanema. Eduardo Kac fala de sua trajetória e observa: “O que guia a obra é sempre a visão do artista, e não os desenvolvimentos da ciência e da tecnologia. Ou seja, o que interessa verdadeiramente é a arte e a poesia”.

 

OF. O que o levou a se dedicar à poesia digital, numa época em que a internet apenas engatinhava?

 

EK. Criei meu primeiro poema digital em 1982 e meu primeiro holopoema (poema holográfico) em 1983. Desenvolvi as duas formas durante os anos 80 e 90, período em que o planeta mudou dramaticamente, tendo na Internet um fator decisivo de transformação. Foi em 1994 que o mundo conheceu a web, mas já no início dos anos 80 eu estava determinado a escrever a poesia do futuro. Trabalhando com vários novos meios de criação, como o Minitel, rede precursora da Internet, desenvolvi uma poesia que iria não apenas corresponder ao novo tempo mas participar ativamente na formação de uma cultura digital, global, interconectada, de informação em fluxo, na qual a palavra abandona a Galáxia de Gutenberg e o que John Cayley chama de “codexspace” (ou seja, os limites materiais da página impressa). Na minha poesia a palavra deixa de ser apenas verbivocovisual e se transforma em interactodinamicomultimedial. Esta foi a grande aventura: inventar a nova sintaxe da nova era.

 

OF. Você criou, em 1997, o termo “bioarte”, hoje em circulação internacional. Em 1999, inaugurou mais um capítulo da arte contemporânea, batizado de “arte transgênica”, com a obra “Gênesis”. Fale um pouco sobre a estratégia que você adota para desenvolver projetos artísticos.

 

EK. Embora haja uma coerência axial na minha busca pessoal, no desenvolvimento de meu universo e em meu vocabulário plástico, do ponto de vista material cada obra requer uma estratégia diferente, pois cada uma possui soluções distintas aos problemas estéticos que defino. Ou seja, cada obra sugere seu próprio caminho. Eu viajo constantemente e produzo as obras em diferentes países, de acordo com a necessidade.

 

OF. Em 2010, você expôs no Oi Futuro Flamengo seus biotopos, lagoglifos e obras transgênicas. O que o público pode esperar desta nova mostra, agora no centro cultural em Ipanema? Entre os 15 trabalhos, algum especial que você gostaria de destacar?

 

EK. Esta exposição oferece um bom panorama da minha poesia digital, criada entre 1982 e 1999. Estão expostos, por exemplo, os quatro poemas que criei para e apresentei online nos anos 80 na rede minitel, precursora da Internet. Há também dois poemas interativos dos anos 90, entre os vários interativos que criei. Outro destaque seria a obra nova que produzi especialmente para a longa vitrine do Oi Futuro Ipanema. Trata-se do poema “Outrossim” (2013), composto de dois códigos QR em anamorfose. O leitor deve usar seu celular com aplicativo leitor de QR e se posicionar na esquerda ou direita da vitrine. Uma vez compensada a anamorfose, o aplicativo faz a leitura. O poema tem dois códigos QR que levam à leitura verbal animada, pois cada código complementa o outro.

 

OF. Como você vê, na cena contemporânea, as relações entre arte, ciência e tecnologia?

 

EK. O meu interesse não reside na ciência ou na tecnologia em si, mas no fato de que a pesquisa abre novos caminhos culturais e materiais e as novas ferramentas permitem ao poeta e ao artista criar obras inauditas que seriam impossíveis com os meios tradicionais. O que guia a obra é sempre a visão do artista, e não os desenvolvimentos da ciência e da tecnologia. Ou seja, o que interessa verdadeiramente é a arte e a poesia. Quanto à cena contemporânea internacional, vastíssima, não há duvida que muitos artistas hoje se interessam por e trabalham com ciência e tecnologia. Vejo isso com simpatia, embora seja preciso dizer que, quando o artista emprega tecnologias já assimiladas, como o lápis e a pintura acrílica, por exemplo, nem o público nem os especialistas percebem que o artista está usando tecnologia. Embora a palavra “ciência” se refira ao conhecimento, a tendência social é chamar de “ciência” o que não se conhece. Quando se conhece, como no caso do carro e do telefone celular, por exemplo, já não chamamos mais nem de “ciência” nem de “tecnologia”. Simplesmente usamos.

 

OF. Suas obras são exibidas, regularmente, ao redor do mundo, além de estarem incluídas nas coleções de diversos museus e em coleções particulares. O que promete a sua produção para o ano de 2014?

 

EK. O highlight do ano será a exposição individual que farei em outubro em Paris, na Galerie Charlot, durante a feira de arte FIAC. A galeria está no Marais, o conhecido bairro de galerias. Por enquanto vamos manter a surpresa, mas posso dizer que o projeto é exibir obras inéditas. Além desta exposição, terei várias coletivas ao longo do ano, incluindo uma no Museu de Arte do Rio-MAR. Também continuo trabalhando em minhas obras de bioarte, que costumam tardar anos para serem completadas porque, nelas, eu invento novas formas de vida. Há que ser paciente. Afinal, o que são seis, ou mesmo dez anos para se criar uma vida nova, se comparados aos quase quatro bilhões de anos de evolução na Terra?

 

Crítica Eduardo Kac

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